terça-feira, 10 de março de 2015

ARTIGOS DOS MEMBROS DO NÚCLEO: "A execução do brasileiro Marcos Archer na Indonésia e a rediscussão da pena de morte"

Assunto adormecido nos últimos anos, a pena de morte revive seu papel na sociedade de uma forma trágica para um brasileiro, Marco Archer, executado em janeiro/2015 na Indonésia pelo crime de tráfico de drogas, uma vez que tentou entrar no país com 13,8 quilos de droga escondida em pranchas de surf.

Não fosse o absurdo propriamente dito da execução pelo crime de tráfico, cometido sem grave ameaça à pessoa ou violência, sendo que o brasileiro já estava na prisão há mais de 10 (dez) anos, ou seja, tempo suficiente para pagamento de pena pelo crime cometido, ainda temos que conviver com a pena capital em muitos outros países do mundo, trazendo um caminho tortuoso, sem volta e sem arrependimentos por parte de quem recebe a condenação, uma vez que inocentes mortos em corredores da morte, não puderam voltar para continuidade da vida, pois este é o tipo de erro que não prevê nenhum tipo de conserto.

Não está se dizendo aqui que o crime de tráfico de drogas não é grave, que não gera dependência nas pessoas, que destrói famílias, abastece o crime organizado, porém, nada que justifique a morte de uma pessoa, aliás, nada justifica.

A pena de morte é um erro e podemos verificar isso nos Estados Unidos, onde a pena de morte ainda é imposta atualmente em 37 (trinta e sete) Estados e tem-se os maiores números de erros do judiciário, ou seja, indivíduos presos que alegavam inocência foram mortos por injeção letal ou cadeira elétrica e anos mais tarde descobriu-se que diziam a verdade, ou seja, que eram realmente inocentes, gerando para as famílias vultuosas indenizações, que não pagam pela vida perdida do ente querido.

Temos um caso emblemático ocorrido também nos Estados Unidos, quando Ron Keine viajava com os amigos no Novo México e foi preso junto dos demais acusado de homicídio, sendo que desde o primeiro momento clamava por inocência. Keine ficou dois anos preso nos anos 70, sem banho de sol, sem chuveiro para banho, apenas com um colchão no chão e um buraco para as necessidades, sem visita da família inclusive, recebendo o veredicto da Corte que seria executado, pois fora considerado culpado.

A defesa de Keine, sabendo de sua inocência, recorreu a todos os Tribunais e a Suprema Corte, porém de nada adiantou, sendo que a Promotoria ratificava a culpa do acusado. A execução por injeção letal estava marcada e há exatos 6 (seis) dias antes da execução o verdadeiro culpado se entregou, livrando Keine da pena de morte, porém, nem sempre o resultado é positivo e muitos inocentes já morreram sem nada dever ao Estado Americano. Esse é só um dos inúmeros casos.

Por isso o assunto é tão debatido pela Organização das Nações Unidas e pela Anistia Internacional, que defendem a abolição da pena de morte no mundo. De primeiro, porque a pena de morte é uma punição extrema, degradante e desumana. Viola o direito à vida. A pena de morte é discriminatória. É frequentemente utilizada de forma desproporcionada contra pobres, minorias, certas etnias, raças e membros de grupos religiosos. É imposta e levada a cabo de forma arbitrária. Nalguns países é utilizada como um meio de repressão – uma forma brutal de silenciar a oposição política.

De segundo, porque é irrevogável e, tendo em conta que o sistema de justiça está sujeito ao preconceito e ao erro humano, o risco de se executar uma pessoa inocente está sempre presente. Esse tipo de erro não é reversível.

Voltando ao caso da Indonésia, ainda que o brasileiro preso no país seja realmente culpado e a execução fosse previsível, não se pode falar que se fez Justiça, muito pelo contrário, pois a execução do brasileiro teve um cunho político e não se lutou por justiça, sendo que o atual presidente Widodo só se elegeu sob promessa que acabaria com o tráfico no país através da pena de morte, logo, nem que no seu íntimo quisesse oferecer o perdão ao brasileiro o faria.

Deve ser levado em consideração que referida promessa do presidente Widodo não se cumprirá, uma vez que a previsão, segundo a Agência Nacional de Entorpecentes é que o tráfico de drogas aumente 45% no país no ano de 2015.

Um detalhe muito importante a ser considerado, é que não há dados ou provas que justifiquem que a aplicação da pena de morte diminuam os crimes ou fortaleça a segurança pública dos países que aplicam essa medida e os Estados Unidos segue como exemplo mais uma vez, pois o crime de terrorismo por ser de cunho federal tem a pena de morte como pena em todo território e nem por isso os atentados diminuem, porque na verdade quem tem essa índole e essa determinação, sabe exatamente qual é o seu fim, a morte, pois, ou morrem no próprio atentado ou em confronto com policiais ou na pena de morte.

Quando, em parágrafo anterior se intitula a pena de morte como discriminatória, além dos exemplos já mencionados, podemos citar países como a Irã, Arábia Saudita e Iraque, onde se condena a pena de morte pelo simples fato da pessoa ser homossexual e através de um show montado em praça pública, pois a população é chamada para assistir a execução daquela vida que sequer teve alguma escolha quanto as arbitrariedades perpetradas.

No Brasil muito se fala que deveria a pena de morte ser aplicada, porém, seria o maior erro da história. De primeiro, porque é um país com muita desigualdade social, logo os pobres seriam os mais prejudicados. De segundo, porque os investimentos em áreas sociais são muito pequenos, seja na educação, na própria segurança pública e muitas crianças e adolescentes sem perspectiva abraçam o crime como forma de vida, o tráfico que comanda os grandes centros, sendo que nesse caso seria muito mais uma questão de injustiça social, do que realmente estaria de tratando de justiça penal.

Ainda que não se aplique no Brasil a pena de morte, existe a previsão legal na CF no artigo 5º, inciso XLVII, para os casos de guerra declarada se cometerem crimes como traição (pegar em armas contra o Brasil, auxiliar o inimigo), covardia (causar a debandada da tropa por temor, fugir na presença do inimigo), rebelarem-se ou incitar a desobediência contra a hierarquia militar, desertar ou abandonar o posto na frente do inimigo, praticar genocídio e praticar crime de roubo ou de extorsão em zona de operações militares, sendo a pena de fuzilamento.

Logo, a pena de morte é um assunto polêmico, muitas pessoas são favoráveis por acompanhar e corresponder aos clamores midiáticos, porém, quem conhece o sistema penal, seja brasileiro, seja no parâmetro mundial, não pode concordar com tal aplicação, uma vez que as injustiças são bem maiores do que fazer parecer buscar pela justiça.

O melhor para todos os países que ainda se utilizam dessa prática, seria buscar a igualdade entre os indivíduos e investir nos quesitos básicos de sobrevivência, inclusive segurança pública, sendo certo que a desigualdade diminuiria e nesse caso por certo tratar-se-ia de justiça, mas a social e não a criminal.
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Dra. Eliane Apª Giaretta Marcato – Advogada Criminalista. OAB/PR 57.310 - Membro do Núcleo OAB Jovem de Londrina

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