segunda-feira, 30 de maio de 2016

A INSEGURANÇA JURIDICA, O NOVO CPC E O AFASTAMENTO DO LIVRE CONVENCIMENTO


Infelizmente, há anos, vivemos a realidade de que após milhares de julgados em determinado sentido, a turma recursal, inesperadamente, muda seu entendimento, muitas vezes de forma divergente da própria lei. Essaconstante insegurança jurídica, originada no princípio do Livre Convencimento, que deve em tese, ser motivado, mas nunca de forma antagônica à lei, destona da realidade vivida no judiciário brasileiro.

Há existência dessa oscilação jurisprudencialé negativa, nos vemos a mercê da carência de segurança jurídica processual,muitas vezes representada por sentençaspautadas no livre convencimento e repletas defundamentações vagas, ou até mesmo inexistentes, como por exemplo; O sistema normativo pátrio utiliza o princípio do livre convencimento motivado do juiz, o que significa dizer que o magistrado não fica preso ao formalismo da lei... (...) levando em conta sua livre convicção pessoal.” [1]

Tendo como exemplo, dessas bruscas guinadas jurisprudenciais, as ações revisionais de financiamento, as ações referentes a aditamentos em contrato de aluguel quanto ao fiador, bem como às que versam sobre o tempo de espera na fila dos bancos. Devido à enxurrada de ações, e baseados no livre convencimento, os tribunais mudaram de entendimento, retirando a força da lei que as embasava.

O Novo Código de Processo Civil expressa que a decisãodeve ser fundamentada por parte do magistrado, como explicita no Art. 489 [2], excluindo o Livre Convencimento do Art. 371[3], e vedando a existência de decisão suprema no Art. 10[4].Demonstrando um afastamento dos desmandos da livre convicção absoluta, como expressa o relator do Projeto o deputado Paulo Teixeira; [5]

“[...] embora historicamente os Códigos Processuais estejam baseados no livre convencimento e na livre apreciação judicial, não é mais possível, em plena democracia, continuar transferindo a resolução dos casos complexos em favor da apreciação subjetiva dos juízes e tribunais. [...] O livre convencimento se justificava em face da necessidade de superação da prova tarifada. [...]”

Há um evidente estreitamento com a Common Law [6], ao originar julgados atribuídos de integridade e coerência, dotadosde um substrato ético-político em sua concretização, isto é, munidos de consciência histórica. Assim, ao considerar a facticidade do caso, em concordância com o entendimento legal, afasta-se cada vez mais do discurso de Bülow ao Imperador, o qual originou as correntes voluntaristas, como a Escola do Direito Livre [7].  Entretanto, não veta a possibilidade de mudança de entendimento, apenas a condiciona, como expresso nos Arts. 926 [8] e 927 [9], que versam a respeito da modulação de efeitos, ao assegurar às partes, igualdade de tratamento com os demais.

O Procurador de Justiça do Estado do RS, Lenio Luiz Streck, mostra-se ferrenho defensor dos novos rumos adotados pelo Novo CPC, fazendo um contraponto entres dois “modelos de juiz”, e como se comportam frente à mudança quanto ao livre convencimento;

“No primeiro caso, um modo dogmático, voluntarista, autoritário, do tipo “sou juiz e não devo satisfação a ninguém”; “aonde já se viu me dizerem como devo julgar”; “nada está acima do meu livre convencimento”. Resultado: quer se mudar de Pindorama.” [10]

Fazendo um comparativo com o segundo modelo de juiz que identifica a falha no livre convencimento absoluto, afinal mesmo um conjunto de excelentes “consciências” leva ao caos, ou, no mínimo, gera a discrepância. Uma vez que os valores pessoais são contingenciais, nos remetendo a Habermas. E “Por isso, uma criteriologia vem bem... Ou seja: mesmo um conjunto de “boas pessoas” não garante decisões adequadas à Constituição.”[11]

Sendo aqui o inicio donosso real embate: a efetiva aplicação dessa nova legislação.E no que diz respeito à indignação de alguns magistrados quanto aos novos rumos do Código de Processo Civil: “Fique conosco e obedeça a legislação. Que, às vezes, não é como você gostaria, mas... o que fazer? Você não é legislador.”. [12]

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[1] STRECK, Lenio Luiz. Novo CPC decreta a morte da lei. Viva o common law! 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-set-12/senso-incomum-cpc-decreta-morte-lei-viva-common-law>. Acesso em: 27 de Abril de 2016.

[2] Art. 489. São elementos essenciais da sentença:[...]II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.§ 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão. § 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.BRASIL. Lei nº 13.105/15, de 16 de Março de 2015. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 28 de Abril de 2016.

[3] Art. 371: O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.BRASIL. Lei nº 13.105/15, de 16 de Março de 2015. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 28 de Abril de 2016.
[4] Art. 10: O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.BRASIL. Lei nº 13.105/15, de 16 de Março de 2015. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 28 de Abril de 2016.
[5] STRECK, Lenio Luiz.Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC. 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mar-19/senso-incomum-dilema-dois-juizes-diante-fim-livre-convencimento-ncpc>. Acesso em: 28 de Abril de 2016.
[6] Common Law: estrutura jurídica mais comum em países de origem anglo-saxônica como Estados Unidos e Inglaterra, onde a fonte do Direito é basicamente a jurisprudência, logo estas devem ser bem fundamentadas,
[7] MELLO FILHO, Rogério Machado, A Aplicação do Direito sob a Ótica das Escolas de Interpretação das Normas jurídicas.
[8] Art. 926: Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. § 1o Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante. § 2o Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.BRASIL. Lei nº 13.105/15, de 16 de Março de 2015. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 28 de Abril de 2016.
[9] Art. 927: Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional. V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. § 1o Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1o, quando decidirem com fundamento neste artigo. § 2o A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese. § 3o Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. § 4o A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. § 5o Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.BRASIL. Lei nº 13.105/15, de 16 de Março de 2015. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 28 de Abril de 2016.
[10] NUNES, Dierle José Coelho. Novo CPC promove o equilíbrio entre magistrados e advogados. Disponível em: <https://www.academia.edu/9811319/Novo_CPC_promove_equil%C3%ADbrio_entre_magistrados_e_advogados> Acesso em: 26 de Abril de 2016.
[11] STRECK, Lenio Luiz.Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC. 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mar-19/senso-incomum-dilema-dois-juizes-diante-fim-livre-convencimento-ncpc>. Acesso em: 28 de Abril de 2016.
[12] STRECK, Lenio Luiz.Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC. 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mar-19/senso-incomum-dilema-dois-juizes-diante-fim-livre-convencimento-ncpc>. Acesso em: 28 de Abril de 2016.



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segunda-feira, 23 de maio de 2016

PLANEJAMENTOS TRIBUTÁRIOS ATRAVÉS DE EMPRESAS “OFFSHORE”

Ter uma conta bancária offshore é uma parte da diversificação internacional. Principalmente se levarmos em consideração a realidade atual, quando controles cambiais e regulamentações governamentais estão ficando cada vez mais rigorosas.
Offshore é um termo da língua inglesa e que significa “afastado da costa”, na tradução para o português. Em termos financeiros, é designada por offshore uma empresa que tem a sua contabilidade num país distinto daquele (s) onde exerce a sua atividade.
Os principais atrativos de uma empresa offshore é a baixa carga fiscal, facilidade na abertura de contas bancárias no exterior, proteção de bens e patrimônio, conveniência e praticidade. A facilidade e rapidez de estabelecer uma empresa, especialmente quando comparamos com a burocracia e custos de uma abertura no Brasil, traz vantagens aos olhos dos investidores, pois gera economia de custos administrativos.
Uma "offshore" é uma pessoa jurídica constituída no exterior, na maioria das vezes em "paraísos fiscais", estes entendidos como países (locais) que propiciam privilégios tributários ou guardam sigilo quanto à composição societária das empresas. Importante ressaltar que nem todas as “offshore” são criadas com objetivos ilícitos, muitas destas surgem de planejamentos tributários lícitos.
É importante esclarecer um equívoco envolvendo empresas offshore: diferente do que se pensa quando ouvimos a expressão “paraíso fiscal”, uma empresa offshore não envolve sonegação de impostos, porém pode ser utilizada para a redução de tributos ou isenção total da carga tributária se for propriamente estruturada. Defendemos a otimização legal dos tributos, nunca a evasão fiscal.
Destaca-se aqui a diferenção de evação e elisão fiscal. Nessa linha, o não ingresso na zona de incidência da norma tributária de forma lícita é chamado de elisão fiscal. Isso significa que na elisão, através de planejamento, evita-se a ocorrência do fato gerador, afastando-se, consequentemente, o pagamento de tributo. Existem várias hipóteses em que o particular pode evitar a incidência da norma tributária sem violar o Direito.
Diferentemente da elisão fiscal, a evasão fiscal caracteriza-se por ser um meio ilícito de afastar o pagamento de tributos. Isso porque na evasão ocorre o fato gerador, mas o contribuinte, valendo-se de métodos escusos, não paga o devido.
 Um exemplo bastante citado pela doutrina é o do particular que pretende adquirir um veículo podendo fazê-lo por contrato de compra e venda parcelada ou por meio de contrato de leasing com cláusula de compra ao final. No primeiro caso há incidência de tributos, já que existe disposição legal. Já quanto ao segundo não, tendo em vista a ausência de dispositivos regulamentando a matéria. Optando pela segunda possibilidade, o particular estará eximindo-se de pagar tributos, sem cometer qualquer irregularidade.
Quanto maior a carga fiscal existente em certos países, maior é o interesse de empresas e pessoas físicas em fazer investimentos no exterior, atraídos por inúmeros fatores, tais como: moedas fortes, estabilidade econômica e política, isenções fiscais ou impostos reduzidos sobre os rendimentos, segurança, sigilo e privacidade nos negócios, liberdade de câmbio, economia de custos administrativos e eventual acesso a determinados tipos de financiamento internacional, a juros baixos.
Além de possuir os interesses tributários, tem-se agregado, a Estabilidade política e legislativa; o Sigilo bancário e comercial; os Serviços financeiros e profissionais de nível de primeiro mundo (onde se encontram os bancos denominados de primeira linha, operados por eficientes e capazes profissionais).
Aliado as essas condições, todas as operações financeiras de uma offshore, podem ser executadas em divisas ou moedas fortes, sem restrições.Equivale dizer que, a moeda Real, pode ser convertida em moeda forte de qualquer outro país, sendo permitido, a transformação desses depósitos em Reais para outras moedas, e vice-versa.
Em resumo, as operações nos citados Paraísos fiscais, através de uma offshore ou, modalidade outra, é hoje, um instrumento para todos aqueles que prestam serviços, investem, ou mantém-se atrelado aos complexos comerciais  e industriais de nível internacional, bem como, nos casos de salvaguarda de interesses patrimoniais de pessoas físicas.
Na atual cenário em que o país se encontra, muito foi discutido através das supostas empresas offshore , e notadamente o caráter criminal que elas se encontram, não é pela caracteristica da empresa, mas sim pela procedência do dinheiro a elas investidos. O planejamento Tributário busca alternativas  de viabilizar o seu negócio e de lhe manter sempre em constante regulamentação com o sistema tributário vigente.

BIBLIOGRAFIA
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 237-238.
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 238.



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Mariana Ribeiro - OAB/PR 74.752
Membro do Núcleo OAB Jovem

segunda-feira, 16 de maio de 2016

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS NOTÁRIOS E OFICIAIS DE REGISTROS PÚBLICOS

Para compreender a situação é importante discorrer sobre alguns conceitos básicos acerca do tema.
De início, faz-se necessário entender a noção do que seja responsabilidade civil. Em geral, toda atividade que acarreta prejuízo traz em seu bojo, como fato social, o problema da responsabilidade2. Vacquin3 observa que “responsabilidade deriva de responder, dar uma resposta”, portanto ela destina a restaurar o equilíbrio desfeito por conta da transgressão normativa/ acontecimento danoso. Assim, responsabilidade é a possibilidade de imputar, por isso “responder”, um ato a alguém sob o dever de reparar. Por conta disso, ela nasce como consequência da violação da obrigação. Por exemplo, caso uma pessoa faça um compromisso de prestar determinado serviço a alguém e não o faz, é responsável; ou se, ao comprar um produto em prestações, não aconteça o pagamento das parcelas restantes. Em síntese, violou-se a obrigação originária. Essa é a ideia geral e básica sobre o instituto.
Além disso, pode-se dividir em dois modos a responsabilidade: objetiva ou subjetiva.
Responsabilidade subjetiva é a clássica, será responsável quem cometer ação com culpa lato sensu (negligência, imprudência ou imperícia) ou dolo. Nos três primeiros casos uma conduta que não havia o desejo pelo resultado, mas por conta de alguma situação de ausência de cuidado ou conhecimento, ele ocorreu. Assim, mesmo que não houve a expressa vontade de incorrer naquele resultado, há a gradação da conduta, a culpa e, consequentemente, a responsabilidade. Já em relação ao dolo stricto sensu, há vontade manifesta e clara de agir de determinado modo e produzir o resultado.
Responsabilidade objetiva são os casos em que não é necessária a caracterização desse elemento subjetivo, seria suficiente apenas a prova do dano e o nexo causal entre ele e a conduta do agente. Como exemplo, há a situação do art. 936 do CC (Lei nº 10.406/02) que afirma ser o dono ou detentor do animal responsável pelos danos que este causar a terceiros. Desta forma, mesmo que não houve culpa do sujeito dono do animal, deve arcar com os prejuízos que seu animal causou porque era responsável pelo seu cuidado.
Passada a situação da responsabilidade, vamos aos notários e registradores. Para não complicar, conceituamos o notário e o registrador como “profissionais do direito, dotados de pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro4”. Não cabe aqui expor sobre delegação, mas saiba que neste caso, por curiosidade, o Poder público não executa diretamente esta atividade e a delega (“atribui”) aos particulares. Desta forma, não é a Prefeitura de determinado Município ou o Estado do Paraná que exerce atividade cartorária, mas sim os particulares.
Ao saber sobre responsabilidade, seus modos e quem são os notários e oficiais, podemos analisar com mais propriedade o tema. A Lei nº 8.935/94 regulamenta o art. 236 da CF dispondo a respeito dos serviços notariais e de registro. Particularmente, em seu artigo 22, houve uma alteração substancial diante da sua “antiga” (2015) redação.
Dispunha anteriormente:


“Art. 22. Os notários e oficiais de registro, temporários ou permanentes, responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros 5 , inclusive pelos relacionados a direitos e encargos  trabalhistas,  na  prática  de  atos  próprios  da     serventia, assegurado aos primeiros o direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos”.


Perceba que em nenhum momento o artigo fala em culpa lato sensu dos notários e oficiais. Desta forma, o elemento subjetivo não era importante para a responsabilização. Caso ocorresse alguma situação de dano provável, apenas era necessário demonstrar o nexo causal entre ele e o sujeito que restaria caracterizada a responsabilidade. Haviam precedentes que entendiam dessa forma:

STJ: (...) O entendimento desta Corte Superior é de que notários e registradores, quando atuam em atos de serventia, respondem direta e objetivamente pelos danos que causarem a terceiros. (...)6

Também a doutrina concordava quase unanimemente a respeito7:


“A nosso ver, a responsabilidade do registrador é objetiva (...) A regra somente exige o elemento subjetivo do preposto, para que o titular da serventia possa exercer o direito de regresso contra este(...) Logo, para caracterizar a responsabilidade civil do registrador bastam o resultado lesivo e o nexo causal entre o dano e a conduta do agente”.

Os fundamentos legais para essa constatação estariam no art. 37 § 6º da CF que afirma: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes8, nessa qualidade, causarem a terceiros”.
Também nesse caso não menção alguma ao elemento subjetivo, o que conduz a uma interpretação sobre a desnecessidade de provar a culpa. Veja que a situação se encaixa porque os serviços cartorários são serviços públicos, exercidos em caráter privado, por delegação do Poder público (art. 236 CF).
Esse entendimento, até aqui, era pacífico na doutrina e jurisprudência em concordar com a responsabilidade objetiva dos notários e registradores.
Porém, mesmo com a antiga redação, Gonçalves pensava de uma forma diversa. Para ele, poderia o autor optar em acionar o poder público com fulcro no artigo 37 § 6º CF pela responsabilidade objetiva ou, diversamente, o notário ou registrador, tendo que, neste caso, provar a culpa9.
Ao que parece, a Lei 13.286/2016 seguiu o entendimento de deste autor e propôs a seguinte redação:

“Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso.

Note que a lei acaba de alterar a situação ao incluir a culpa na caracterização da responsabilidade dos notários e oficiais de registros. Essa mudança é deveras importante porque aquele que foi prejudicado por algum ato notarial necessita provar a culpa do notário, diferentemente da situação anteriormente pacificada em que a responsabilidade era objetiva e o elemento subjetivo não era requisito. Desta forma, atribuir a responsabilidade a um oficial cartorário ficou mais difícil diante da infausta necessidade de provar a culpa. Pense: o quão complexo seria diante de uma grande cidade como São Paulo num cartório central que realiza centenas, ou até milhares, de atos diários, ser necessário demonstrar o elemento volitivo do oficial por conta do ato danoso que realizou em prejuízo a alguém?
A constitucionalidade da Lei nº 13.286/2016 provavelmente será questionada no STF. Isso porque, como vimos acima, o entendimento dominante consiste em aplicar aos notários e registradores a regra do art. 37, § da CF/88 prevalecendo a responsabilidade objetiva. Enquanto isso, a nova lei com esse entendimento já é válida e está produzindo efeitos nacionalmente.

1 Artigo elaborado para o Blog Núcleo OAB Jovem Londrina/PR em 14/05/16.
2 Gonçalves, Carlos Roberto, Direito civil brasileiro, volume 4: responsabilidade civil / Carlos Roberto Gonçalves. – 9. ed. – São Paulo : Saraiva, 2014, pg. 21,0 (programa calibre), livro digital
3 Apud Mello, Celso Albuquerque de. Responsabilidade Internacional do Estado, Rio de janeiro: Renovar, 1995, p. 4
4 Loureiro, Luiz Guilherme, Registros públicos : teoria e prática / Luiz Guilherme Loureiro. - 5. ed. rev., atual e ampl. - Rio de Janeiro : Forense ; São Paulo : MÉTODO, 2014, pg 56,7 (programa calibre), livro digital
5 Grifo nosso
6 STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 110.035/MS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 23/10/2012 7
7 Loureiro, Luiz Guilherme, Registros públicos : teoria e prática / Luiz Guilherme Loureiro. - 5. ed. rev., atual e ampl. - Rio de Janeiro : Forense ; São Paulo : MÉTODO, 2014, pg 73,6 (programa calibre), livro digital, com grifos nossos
Grifo nosso
9Gonçalves, Carlos Roberto, Direito civil brasileiro, volume 4: responsabilidade civil / Carlos Roberto Gonçalves. 9. ed. São Paulo : Saraiva, 2014, pg. 685,4 (programa calibre), livro digital

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Guilherme Lucas Valério - OAB/PR 80.054
Membro do Núcleo OAB Jovem

sexta-feira, 13 de maio de 2016

Campanha de Inverno Solidário 2016

No dia 10 de maio foi iniciada a Campanha de Inverno Solidário de 2016, que tem o objetivo de arrecadar mais de 700 agasalhos e cobertores em boas condições de uso, além de doações de calçados, tocas, meias, cachecóis, entre outras peças que serão destinadas a instituições carentes.

A Campanha está sendo coordenada pela Dra. Ludmila Uliani, juntamente de uma subcomissão voltada especificamente para este projeto, sob o apoio ainda da Dra. Vanessa Armeni de Paula Machado, coordenadora de Apoio Filantrópico desta comissão.



Em colaboração com o projeto, o Folks Pub, em mais uma parceria com o Núcleo Jovem promoveu a festa de lançamento da campanha no dia 11 de maio, que conseguiu arrecadar mais de 40 agasalhos.





Já começamos com esta linda ajuda, e ressaltamos então, que a arrecadação continua até o dia 10 de junho, e as doações podem ser entregues nos seguintes pontos:

- sede da OAB Londrina;
- salas da OAB do Fórum Estadual e Justiça do Trabalho de Londrina, Cambé, Ibiporã e Rolândia;
- sala da OAB da Justiça Federal de Londrina;
- e através dos membros do Núcleo Jovem;

Como já é possível notar, o frio já chegou, portanto não podemos perder tempo! Precisamos da ajuda de todos vocês, para que possamos diminuir o sofrimento daqueles que não tem como se aquecer!

Lembrando que o que você não usa mais, pode ser usado por quem precisa.


Avisem os amigos, e façam suas doações

terça-feira, 10 de maio de 2016

PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO COMO DEVER ANEXO DE CONDUTA

O princípio da boa-fé objetiva, presente em todas as relações contratuais da sociedade moderna, passou a ter maior destaque nas relações de consumo.
Para Cláudia Lima Marques, "Boa-fé objetiva significa uma atuação "refletida", uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes"[1].
A autora esclarece que a nova teoria contratual consumerista, baseada e nortada pelo princípio da boa-fé objetiva, trata-se de uma visão dinâmica e realista que nos impõe a observação de que "as relações contratuais durante toda a sua existência (fase de execução), mais ainda, no seu momento de elaboração (de tratativas) e no seu momento posterior (de pós-eficácia), fazem nascer direitos e deveres outros que os resultantes da obrigação principal. Em outras palavras, o contrato não envolve só a obrigação de prestar, mas envolve também uma obrigação de conduta!"[2]
Extrai-se então a lógica e o direito que o novo norteamento dos contratos impõe aos parceiros contratuais, qual seja a necessidade de observação dos deveres/obrigação de conduta.
O Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/1990 – trouxe o pensamento acima exposto às relações contratuais consumerista no Brasil, positivando o princípio da boa-fé como linha teleológica de interpretação (art. 4º, III) e como cláusula geral no artigo 51,IV, trazendo consigo todos os deveres anexos de conduta advindos da relação contratual entre os sujeitos dessa relação.
O primeiro dever anexo, e possivelmente o mais importante, é o dever de informar (art. 30 e 31, do CDC).
O dever de informar é "anexo" a toda a extensão da relação contratual, acompanhando-a desde o início ao fim, não devendo se extinguir ao final da fase pré-contratual. Tal afirmação é entendimento uníssono dentre os estudiosos consumerista, restando aprovada, por unânimidade a Conclusão n. 3 do V Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor, em Belo Horizonte, 02.05.2000, o seguinte ensinamento: "Os deveres de informação nos contratos de prestação de serviços aplicam-se nas fases pré-contratual, contratual e pós-contratual".
 Com o exposto é possível afirmar a importância e necessidade da prestação da informação clara e adequada ao consumidor, cabendo ao Estado, na forma assegurada constitucionalmente, proteger e resguardar o consumidor, essencialmente vulnerável, das omissões e falhas realizadas pelo fornecedor, que por muito busca o lucro acima de qualquer direito individual de quem é, ou deveria, ser seu ‘parceiro’ contratual.


[1]MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais; 6ª Ed. ver., atual. e amp.; São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 216.
[2] Idem, ibidem, p. 217.



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Gustavo Henrique Gonçalves Baccarin - OAB/PR 75.659
Membro do Núcleo OAB Jovem Londrina

terça-feira, 3 de maio de 2016

A mediação nas relações familiares

O novo código de Processo Civil instituiu como método facilitador de solução de conflito, entre outros, a mediação. O legislador seguiu uma tendência atual presente no meio forense da ideia da autocomposição, especialmente no ramo do Direito de Família.

Em suas disposições o NCPC, no que tange ao capitulo dedicado às ações de família, cita a mediação em diversos trechos, evidenciando a importância da aplicação do instituto como um método eficaz de solução de conflitos das relações familiares.

A grande maioria dos processos judiciais envolvendo as relações familiares são julgados conforme os fatos trazidos nos autos, não representando o real interesse das partes. Por esta razão, o instituto da mediação chega como uma alternativa adequada para restabelecer o diálogo entre as partes, pois, o procedimento tem como objetivo que as próprias partes encontrem uma solução para seus problemas familiares através de um mediador.

Para que a mediação alcance a finalidade esperada de uma solução equitativa, o procedimento deve observar algumas regras e princípios norteadores, a fim de visar à igualdade entre e para as partes, dentre os quais podemos citar como exemplos: a imparcialidade, a independência, a autonomia, o respeito à ordem publica e as leis vigentes, a confidencialidade.

Atualmente, grande parte das crises familiares pode ser resolvida sem a necessidade do ajuizamento de ação litigiosa judicial, razão pela qual no inicio do NCPC se estabeleceu que os juízes, advogados, defensores públicos e promotores devem estimular a solução consensual das controvérsias, através da mediação ou de outros mecanismos.

O NCPC traz em seu dispositivo legal (artigo 695) a imposição do procedimento da mediação, ao dispor o juiz quando do recebimento da petição inicial ordene a citação do réu para comparecer a uma audiência de mediação e conciliação.

A mediação nas relações familiares foi instituída para ser aplicada como um procedimento aliado do poder judiciário, a fim de apresentar uma maior satisfação aos reais desejos das partes e evitar um fim traumático e uma judicialização dos conflitos, prevenindo também os excessos de demandas judiciais, as quais não conseguem dar resposta eficaz aos interesses das partes.

Deste modo, é evidente que a mediação é um instrumento de pacificação e solução dos conflitos, no entanto, resta ainda ao Estado a responsabilidade de adotar medidas adequadas para que os procedimentos de soluções de conflitos atinjam os fins para os quais foram propostos.

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Letícia Farias Lacerda - OAB/PR 65.756

Membro do Núcleo OAB Jovem Londrina